terça-feira, 7 de maio de 2013

Jovens homossexuais são prejudicados por falta de amparo




No Brasil, a falta de leis para proteger e amparar homossexual na juventude reflete no medo que esse grupo tem de assumir a homossexualidade para a família e a sociedade

           
João Barbosa e Isabella Naves                                       


Segundo dados divulgados pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, em 2011 foram denunciadas 6.809 violações de direitos humanos contra lesbicas, gays, bissexuais e travestis (LGBT). Os estados com maior incidência foram São Paulo (1.110), Minas Gerais (563) e Rio de Janeiro (518). Goiás ocupou uma das últimas posições, com 137 violações. Dentre as vítimas 67,5% são homens, 26,4% mulheres e 47,1% tinham entre 15 e 29 anos. Ou seja, em quase metade das denúncias, as vítimas são jovens e fazem parte de um grupo que possui menos auxílio específico, pois existem no Brasil diversas Organizações Não Governamentais (ONGs) que protegem e ajudam pessoas que sofrem de com a homofobia, mas as que são exclusivas para jovens são escassas.
            São inúmeros os casos dos jovens que sofrem problemas ao ter que lidar sozinhos com a rejeição familiar, social e até com o próprio preconceito. Muitos deles escondem a homossexualidade da sociedade e principalmente da família, por isso, os nomes adotados nesta reportagem são fictícios. Com o teleoperador Rafael de Souza não foi diferente. Ele teve grande dificuldade para entender o que realmente estava acontecendo. “No início, pensei que fosse apenas uma fase e que poderia controlar meus ‘instintos’, mas quando percebi que não, foi frustrante.” O que fez com que Rafael ficasse mais preocupado foi saber que iria decepcionar a sua família. “Todas as expectativas que meus pais tinham para mim foram por água abaixo”.
A atriz e produtora Luiza Soares, de 20 anos, passou por situações um pouco mais complicadas. “Eu namorei escondida da minha família por dois meses, até a minha mãe me seguir e descobrir tudo.” A jovem, que na época tinha completado 18 anos, foi agredida pela mãe e também expulsa de casa. “Fiquei totalmente desamparada. Eu e minha mãe sempre fomos muito próximas. Eu jamais esperava uma reação dessas, até porque minha mãe nunca teve problemas com meus amigos gays.” Após ser expulsa de casa, Luiza foi morar com o pai, que aceitava melhor sua condição sexual, até conseguir estabilidade financeira para se sustentar. Hoje ela mora com a companheira e também atriz Julia Guerra, de 27 anos, mas a relação das duas ainda não foi aceita pela mãe de Luiza.
O ator Carlos Silva, de 17 anos, também teve que sair de casa impulsionado pelo preconceito da família. “Fui criado pelos meus avós no interior, num ambiente totalmente religioso e homofóbico, por isso, assim que tive chance, me mudei para Goiânia.” Segundo Carlos, foi só com essa mudança que as coisas vieram a melhorar. “Goiânia abriu novas portas para mim, apesar de já ter sofrido preconceito aqui, nada se iguala ao que eu passava com minha família”.
Mas nem sempre as coisas são tão complicadas. O teleoperador Fernando Batista, 24 anos, tem a aceitação de sua homossexualidade por toda a família. “Quanto contei para meus pais, minha mãe foi a única que reagiu de forma negativa, mas, após alguns meses, e com o apoio dos meus irmãos, nossa relação voltou ao normal.” Hoje Rodrigo tem total liberdade de levar o namorado à casa de seus pais. “O levo até nas festas de família, ninguém nunca criou problemas”.


Legislação homossexual

Desde a Grécia antiga há registros de casos de homossexualidade, mas somente na década de 1980 esse grupo chamou a atenção mundial. Esse reconhecimento não surgiu de forma positiva, pois foi motivado pela epidemia de AIDS que se iniciou em meados daquela década. Com a falta de amparo legal para a união entre pessoas do mesmo sexo, quando um casal era afetado pelo vírus, o sobrevivente não era reconhecido judicialmente. Nesse cenário que as primeiras leis tratando da homossexualidade foram criadas em países como Dinamarca, Noruega e Suécia. Foi também nessa época que surgiram os primeiros movimentos LGBT que focavam na igualdade de direitos entre homossexuais e heterossexuais.
            Hoje, apesar dessas lutas ainda existirem no mundo todo, a situação do homossexual em alguns países melhorou bastante, como é o caso do Canadá, Portugal, Argentina e alguns Estados nos EUA, que possuem leis que criminalizam a homofobia e permitem a união entre pessoas do mesmo sexo. No Brasil, apesar de existir a união estável homoafetiva e até o casamento entre pessoas do mesmo sexo no estado de Alagoas e recentemente também o estado de São Paulo, a homofobia ainda não é considerada um crime específico. A homofobia só é condenada no Brasil se for enquadrada como crime de ódio e, de forma genérica, pela Constituição de 1988, que condena qualquer tipo de preconceito.
            Segundo a advogada e professora Ana Paula Félix, especialista em Direito Familiar, o maior problema nas discussões sobre homossexualidade no Brasil é a falta de amparo legal para o jovem que está descobrindo a sua sexualidade. “Dependendo da idade do jovem é possível ele ser apoiado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), mas não existe nada especifico para a proteção do jovem homossexual, que se encontra numa fase de descobertas, gerando dúvidas, incertezas e preocupações. É necessário um trabalho de cuidado e proteção legal.” Além disso, Ana Paula afirma que deve haver também amparo no âmbito familiar e social, “para que o jovem não cresça e se torne um adulto problemático e inseguro, que acha que deve esconder a sua condição da família e da sociedade”.
            Atualmente está em discussão na Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal o Projeto de Lei 122/2006, conhecido como PL 122, que propõe a criminalização dos preconceitos pela condição homossexual e pela identidade de gênero. Apesar de ter sido criado em 2006, o projeto de lei sofre, desde a sua criação, a pressão da bancada evangélica do Senado Federal que alega que a proposta fere a liberdade religiosa de expressão por prever até cinco anos de cadeia para quem criticar publicamente a homossexualidade.


Comissão de Direitos Humanos

            Recentemente foi eleito para a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara dos Deputados do Brasil o deputado e pastor da igreja Assembleia de Deus Marco Feliciano (PSC - SP). A eleição do deputado causou grande polêmica e revolta no país, pois Marco Feliciano é conhecido por suas declarações controversas de cunho racista e homofóbico. Essas declarações motivaram varias ONGs, artistas, políticos e até mesmo grupos religiosos a organizarem protestos para tentar tirar o parlamentar da presidência da comissão.
            Para o jornalista e consultor em direitos humanos Liorcino Mendes, os atuais parlamentares não estão preparados para responder as necessidades da população brasileira. “A eleição do pastor Marco Feliciano para a Comissão de Direitos Humanos demonstra que a atual bancada de parlamentares federais não está ‘antenada’ para as verdadeiras necessidades da população brasileira, especialmente com os direitos humanos.” Para Mendes, o Brasil precisa de uma reforma política, “reduzindo o número excessivo de partidos de aluguel, garantindo o financiamento público de campanha e dando maiores poderes à população que os elegeu”.
            Mesmo enfrentando protestos em todo exigindo a saída do parlamentar da CDHM, Feliciano afirma que não deixará o cargo. Em uma recente entrevista dada a um jornal paulista, o deputado afirma não ser homofóbico e sim um pastor que segue o que está escrito na Bíblia. Ela “é contrária à prática homossexual”.
            Em resposta à nomeação de pastor, um grupo de deputados criou a Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos Humanos, que é um espaço político para assegurar a discussão de temas ligados à diversidade e às minorias, baseando-se nos movimentos sociais e nas populações historicamente excluídas. Segundo os parlamentares que fizeram parte da iniciativa, muitos deles membros da CDHM, a nomeação de Feliciano não permitirá que a Comissão de Direitos Humanos possa exercer corretamente o seu papel.


Ser-tão

                O Ser-tão, é um núcleo de estudos e pesquisas em gênero e sexualidade vinculado à Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Federal de Goiás. Criado no fim de 2006 e em atuação até hoje, o núcleo tem como missão a produção de pesquisas e conhecimentos voltados à divulgação e promoção dos direitos sexuais e de gênero. Algumas pesquisas realizadas pelo núcleo são:
o   Mercado GLS: pesquisa sobre a dinâmica e o surgimento de lazer e sociabilidade GLS na cidade de Goiânia;
o   Movimento LGBT: análise da história e da dinâmica de atuação dos movimentos LGBT no estado de Goiás;
o   Políticas Públicas para População LGBT: mapear as políticas públicas governamentais voltadas para o público LGBT;
o   Políticas Culturais LBGT: mapeamento das propostas de ações que envolvem a chamada cultura LGBT e políticas culturais LGBT desenvolvidas no estado de Goiás.
           


PS: Reportagem produzida na aula de Redação Jornalística II para o jornal laboratório da PUC-GO.

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